sábado, 16 de dezembro de 2006

Copying Beethoven : o filme que fala do compositor que mudou a cultura musical !






Copying Beethoven
Agnieszka Holland, 2006


"Music is the language of God!
Musicians are the closest to God as men can be. We hear His voice. We read His lips."



Copying Beethoven estava no meu roteiro cinema em final de sábado à tarde. Há já algumas semanas.

Fugindo da azáfama consumista e desatinada que percorre o país nesta época pré-natalícia, procurei o filme cuja temática atrairia um público mais selectivo. Música erudita é, infelizmente no nosso país, para alguns. 

Eu sou uma priviligeada, graças à educação que recebi. E agradeço profundamente a meus pais que sempre foram amadores de coisas belas. Música, pintura, literatura, arte em geral.





Ed Harris/ Beethoven
Copying Beethoven
Agnieszka Holland, 2006

Percorrer musicalmente alguns dias da vida de Ludwig van Beethoven, mais propriamente os últimos três anos da sua atribulada existência, era sem sombra de dúvida uma pausa que me agradava plenamente! Atribulada, mas grandiosa!

Nesse silêncio feito de enleio estético, aventrei-me nos sons de excertos musicais de obras suas, num recolhimento quase em tom de prece, introversão salpicada de excelente diálogos.





Diane Kruger
Copying Beethoven
Agnieszka Holland, 2006

Título em português, Corrigindo Beethoven, o que só por si demonstra alguma (?) falta de cultura musical erudita, já que copying deriva da palavra copyiest. Traduzida para língua portuguesa, dá origem à palavra - copista - termo técnico dado à pessoa que escrevia (à mão) as partituras dos grandes mestres e compositores.

Assim, já se atraiçoa, sem querer, a intrínseca intenção da realizadora que afirma:

"The journey during the film is to learn about the music, but also to learn about the man... to come closer and closer to the music and to the man."

Agnieszka Holland





Ed Harris & Diane Kruger
Copying Beethoven
Agnieszka Holland, 2006

A música é sem dúvida a 'personagem' principal do filme onde o actor Ed Harris personifica, com grande mestria, os últimos três anos [1824-1827] da vida de Ludwig van Beethoven. Mais propriamente, os derradeiros que este dedicou à conclusão da 9ª Sinfoniana qual trabalhou durante dez anos.
"He changed the very notion of music, destroying rules, conventions [...] bombastic, brilliant, generous, unforgiving, yet kind hearted, Beethoven ruled over the cultural landscape of Europe in the first quarter of the 19th century."

Agnieszka Holland





Ed Harris
Copying Beethoven
Agnieszka Holland, 2006

A incrível caracterização e sublime interpretação de Ed Harris quase nos leva a crer estarmos diante do próprio Beethoven.

Outra coisa não seria de esperar de um actor que realizou e personificou já a figura emblemática da pintura norte-americana -
Pollock - outro ser verdadeiramente dilacerado no seu acto criador.

Copying Beethoven transmite-nos a pungente, silenciosa e desesperada solidão de Beethoven, através dos olhos de Anna Holtz, melhor aluna de Composição do Conservatório de Viena, uma personagem ficcionada a partir de componentes da época, aqui interpretada por Diane Kruger.





Anna Holz/ Diane Kruger
Copying Beethoven
Agnieszka Holland, 2006

Apesar de já se atravessar o século XIX, ainda não era reconhecido à mulher o dom, a arte de 
criar, quer em música, literatura, ou outra actividade artística. 

Anna Holtz demonstra aqui a incrível vontade de vencer pelo seus próprios méritos, como criadora e mulher, vendo em Beethoven a sua oportunidade maior de aprender e se afirmar num campo que só era permitido aos homens.
"I may be a woman but I am the best student!"

(Anna Holtz, Copying Beethoven)

Em impressionante diálogo somos transportados à visão divina da música.





Copying Beethoven
Agnieszka Holland, 2006

"Musicians are the closest to God as men can be.
We hear His voice. We read His lips."

(Copying Beethoven, film)

Em imagens de incrível beleza cénica, numa fotografia cuidada que realça tantas vezes o divino da criação, sobressaem os momentos de precisão e perfeição da arte de 'copista' musical, as fúrias de Beethoven em revolta permanente contra um Deus que lhe deu o dom tão divino, e que depois lhe retira a capacidade de se ouvir. 





Copying Beethoven
Agnieszka Holland, 2006






9ª Sinfonia (documento original)



A profunda tranquilidade do mestre nos actos de composição, quer compondo ao piano ou violino, quer em momentos de recolhimento, ou de inspiração no silêncio da natureza onde se refugiava para percepcionar as vibrações que esta lhe transmitia... Tudo isto até se chegar à première da 9ª Sinfonia.






Anna Holtz/ Diane Kruger
Copying Beethoven
Agnieszka Holland, 2006


Guiado pelos olhos e pelas mãos de sua fiel copista, que conhecia de cor a partitura, dando-lhe os tempos necessários para que frente à orquestra, como maestro, pudesse executar a sua obra-prima. 

Na première da 9ª Sinfonia, Beethoven já estava completamente surdo,

"I will help you, I will stand where you can see me, I'll give the bite for you."

(Copying Beethoven)


E Anna Holtz, saindo do meio da orquestra, vinha carinhosamente virar Beethoven para o público a fim que este pudesse ver as pessoas a ovacioná-lo de pé e 'sentisse' pelas vibrações, os aplausos.

"You are the key to my release."

(Copying Beethoven, film)


Se mais não fora, valeria a pena ver este filme, para ouvir a interpretação da 9ª Sinfonia interpretada pela Orquestra Sinfónica Kesckemét Húngara onde estão incluídos alguns instrumentos musicais do século XIX, tocados com arcos da época (violinos e violoncelos), o que dá, sem dúvida, o timbre perfeito da música beethoveana.

A não perder! Bem como as entrevistas aos actores, gravadas em vídeos.






Diane Kruger & Ed Harris
Copying Beethoven
Agnieszka Holland, 2006

Copying Beethoven esteve representado em dois conceituados festivais de cinema:

Toronto Film Festival  Canada (2006)

Quando o filme acabou, na sala ninguém se mexeu. Todos nós permancemos sentados, ouvindo religiosamente até ao último excerto musical do genérico final.


*Nota: Google celebrou o 245 aniversário (baptismo) de Beethoven com um Doodle interactivo, em 2015. Aconselho vibrantemente a interagir com o vídeo.


 "Here’s to one of history’s greatest artists." 

Google Doodlers


G-S

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16.12.2006
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segunda-feira, 27 de novembro de 2006

A Cesariny [1923-2006]



Amo-ris actus
Mário Cesariny
via Triplov


(...)

Acredita na imortalidade?
Não sei. Quando lá chegar, eu telefono (risos)...

Mário Cesariny, última entrevista a Vladimiro Nunes



A manhã está tão triste
que os poetas românticos de Lisboa
morreram todos com certeza


Santos
Mártires
e Heróis


Que mau tempo estará a fazer no Porto?
Manhã triste, pela certa.


Oxalá que os poetas românticos do Porto
sejam compreensivos a pontos de deixarem
uma nesgazinha de cemitério florido
que é para os poetas românticos de Lisboa não terem de
recorrer à vala comum.


Mário Cesariny, Todos por um

G-S


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27.11.2006
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domingo, 19 de novembro de 2006

Exposição Anos 80 - Uma Topologia







Untitled [# 89, Flowered Sheets] 1981
Cindy Shermann
"Parte do interesse em revisitar os anos 80 resulta de que muita da arte de hoje reflecte esse legado, embora negando ou ignorando esse passado. Reconsiderar os anos 80 pode servir como ferramenta para destacar e reflectir sobre alguma da arte do presente. (...)

A Fundação de Serralves é um dos espaços culturais mais completos e interessantes da cidade do Porto. É nesses espaços que encontramos excelente momentos de arte contemporânea.

Inaugurada no Museu de Arte Contemporânea a Exposição Anos 80: Uma Topologia estará patente de 11 de Novembro 2006 a 25 de Março de 2007. 

É comissariada por Ulrich Loock e integra cerca de 250 obras de referência de 73 artistas de todo o mundo.



Exposição Anos 80: Uma Topologia
créditos : Serralves

"Neste tipo de abordagens a paradigmas históricos, é necessário identificar as práticas estéticas que constituem o núcleo da exposição Anos 80: Uma Topologia.
(...)
A ênfase dada a estes trabalhos reside na necessidade de reavaliar a obra de arte como lugar de transformações (escultura/linguagem, nome/imagem, padrão/escrita, arquitectura/escultura, pintura/fotografia)."

in http://www.serralves.pt



"Porquê os anos 80? Nessa década o mundo assistiu a mudanças significativas nos campos político, social e cultural. Estas geraram novos desenvolvimentos, de grande alcance, cujos desfechos se têm revelado nos anos que agora vivemos. Os anos 80 são o tempo entre a história recente e o presente.
(...)
A Exposição organiza-se em núcleos geográficos (ex: Düsseldorf, Colónia, Áustria/Países de Leste, Bélgica/Holanda, França, Grã-Bretanha, Península Ibérica, América do Sul, Nova Iorque, Los Angeles, Vancouver, artistas isolados..." (...)

in http://www.serralves.pt



Exposição Anos 80: Uma Topologia
créditos : Serralves
Para todos os que se desloquem ao Porto ou vivam na cidade, será imperdoável não percorrer todas as salas do Museu e admirar a vasta obra representada. 

Trata-se de uma topologia apoiada no olhar do seu comissário Ulrich Loock, director-adjunto do Museu, mas recolhe um infindável número de obras.

Apenas pude reter uma leve abordagem panorâmica, dado que será preciso voltar mais do que uma vez.

Mas o espírito estético e o meu olhar atento sentiram-se de imediato envoltos na perspectiva e na dinâmica desta esplêndida Exposição e das obras e autores nela representados. Lá voltarei!

Para os grandes apreciadores de Fotografia, um verdadeiro relicário de Autores que abriram efectivamente os cânones da arte de fotografar! 


Uma grande área da Exposição é dedicada a este vertente da arte: a fotografia.

Outra área que me apraz registar é integração de um artista nativo-americano Jimmie Durham, uma visão da arte índia norte-americana.

Breves apontamentos sobre Acontecimentos da Década de 80:

No final dos anos 70 alguns acontecimentos devem ser considerados determinantes para o que aconteceu no início da nova década:

A eleição de um Papa polaco – passo decisivo que deixava antever o princípio do fim do domínio comunista nos países do Pacto de Varsóvia.

A revolução islâmica no Irão - manifestando o surgimento de um novo poder desequilibrante da lógica Leste - Ocidente.

O nascimento do primeiro bebé proveta, a 25 de Julho de 1978 – desafio aos procedimentos naturais de gerar vida humana.

No final dos anos 80, a queda do muro de Berlim (1989) foi o evento mais visível...


(texto com supressões)

G-S

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19.11.2006
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sábado, 11 de novembro de 2006

O Ilusionista : o filme !






The Illusionist

Neil Burger, 2006
http://www.imdb.com/



"He's a Magic Man."


Karen Durbin (ELLE) *


Sábado chuvoso. Nada melhor do que uma sessão de cinema.


Entre música, livros e cinema, eis as três sombras por onde divago em tempo de lazer.


Apressadamente, passei os olhos pelo sítio web do filme The Illusionist e dois actores - Edward Norton e Paul Giamatti - me convenceram de imediato. Sem hesitação, fui!





Edward Norton & Paul Giamatti
The Illusionist/ O Ilusionista
Neil Burger, 2006

Paul Giamatti, intérprete do bem recente The Lady of the Water, Edward Norton em papéis sempre controversos, mas de grande qualidade e nobreza de interpretação. Um porte esplendoroso! 

Uma fábula elegante baseada na obra «Eisenheim The Illusionist» do premiado Pulitzer Stephen Millhauser por onde perpassa a arte, o amor e a intriga política na barroca Viena dos Habsburgs, no virar de 1900.







Edward Norton & Jessica Biel
The Illusionist
Neil Burger, 2006

Uma alquimia latente desde o primeiro encontro de um ilusionista de origem humilde com uma jovem duquesa. Um e outro vão deixar seus corações irremediavelmente presos num amor proibido.

Afastados durante anos, voltam a cruzar-se mais tarde quando ele volta à cidade, numa trama que ultrapassará toda a previsibilidade dos espectadores pelo tom convincente, majestoso, enigmático que Edward Norton imprime tão naturalmente à personagem.






Edward Norton
The Illusionist
Neil Burger, 2006

O jovem ilusionista de quem se desprende um imenso magnetismo, obtido segundo uma das lendas, ao cruzar-se com um mago durante um passeio campestre, consegue convencer o ambicioso Inspector policial - Paul Giamatti - para quem a magia e o ilusionismo são ao mesmo tempo um forte atractivo e fonte de entretenimento nas horas de ócio.

Um filme cativante, numa adaptação talentosa de Neil Burger, realizador de Entrevista com o Assassino (2002) construída num elo que gira em volta de ingredientes tão fascinantes como romance, intriga política palaciana, mesclada de hipnose, com muitos conceitos freudianos, suspense numa senda de pistas subtilmente encadeadas, e encontros descompassados.







Edward Norton
The Illusionist
Neil Burger, 2006

A noção de tempo que este mágico apresenta a partir de uma laranja que depois de extraída a semente, se transforma numa laranjeira em pleno representação é espantosamente filosófica e deixa-nos pensativos sobre o que todos nós fazemos do tempo ou sentimos acerca dele.

O lenço de mão que esvoaça seguro por duas cintilantes borboletas - a simbólica da borboleta tem uma forte incidência amorosa na trama - até à espada do herdeiro, em incursão coloquial sobre Excalibur - ligada às lendas arturianas - tudo isto faz deste filme um incrível momento de magia, beleza, atravessado sempre de mistério e magnetismo que passa da audiência do teatro local, para a sala de cinema, já que filmado subtilmente em luz muito ténue e difusa, até ao momento do desvendar da verdade.






Paul Giamatti/ Jessica Biel/ Edward Norton
premiere The Illusionist
créditos: Getty Images

Aí a tela inunda-se de luz num ambiente contrastantemente campestre, chamando à realidade os espectadores, como se despertados fossem de um sono hipnótico onde o encantamento prevaleceu num toque de magos.

De assinalar a banda sonora de Philip Glass, sóbria, minimalista, apoio ao suspense que atravessa todo o filme, bem como a fotografia esplendorosa de Dick Pope num jogo contrastante de claro/escuro.



"Romantic... smart... gorgeous!"

Bob Mondello (NPR)*


G-S

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11.11.2006
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domingo, 15 de outubro de 2006

A Senhora da Água : um olhar encantado !






Lady in the Water
M. Nelliyattu Shyamalan, 2006

Falar de um filme tem sempre uma conotação muito subjectiva.

Cada um de nós é uma voz que passa muito mais pela estética do sentir do que pela razão do conhecimento.

Quando vi o trailler, fiquei atenta ao recente trabalho cinematográfico de M. Night Shyamalan - Lady in the Water.

Outros filmes deste escritor/realizador me detiveram - Sinais, A Vila e Sexto Sentido, este incondicionalmente!

Acredito pelo pressentir que não estamos sós... e que temos que abrir o nosso universo a outras realidades cósmicas.




Lady in the Water
M. Nelliyattu Shyamalan, 2006

Desta vez, Shyamalan (personagem no seu próprio filme) parte de uma história de adormecer, inventada para seus filhos, recontada pela voz de uma senhora chinesa e que percorre muitas das referências de lendas célticas e nórdicas - a tradição dos povos é universal - miscigenação de ninfas, brumas, ambientes aquáticos, seres fantasmagóricos saídos do verde das florestas ou dos bosques que vêm ao encontro de um ser com capacidades extra-sensoriais: O zelador de um condomínio!

É um filme-metáfora onde se entrecruzam as várias vertentes da solidão urbana, e por isso se torna mais clarividente a vinda de uma ninfa a este ambiente tão despido de sentimentos de partilha.




Lady in the Water
M. Nelliyattu Shyamalan, 2006

Regra geral, os condomínios são sítios bastante solitários, homens e mulheres vivem paredes meias como referências quase invisíveis, trespassados por olhares distantes, frios ou distraídos.

É precisamente este espaço vazio do calor humano que vai transformar-se em espírito comunizado de entreajuda.

O zelador que normalmente se restringe a gerir espaços comuns, percorre aqui solicitamente os apartamentos, conversando com os inquilinos, apoiando ao mesmo tempo nas pequenas tarefas todos os que aí vivem.





Lady in the Water
M. Nelliyattu Shyamalan, 2006

Portanto, a personagem ideal para servir de receptor e retransmissor, ligando humanizadamente os condóminos à ninfa portadora de uma mensagem.

Terminada esta missão, ela deve regressar ao seu universo marinho, já que escolhida para reger os destinos de seus pares.

Mas eis que esta ninfa-rainha se apresenta imbuída de fragilidades humanas, tão carenciada de afectos e submersa de medos como qualquer um dos seres que se unem para a apoiar no seu retorno.

Uma narrativa que encerra uma mística incondicional e irrefutável: não há actos isolados.

Cada acção individualizada tem incidências em todo o Universo e seus habitantes.




Lady in the Water
M. Nelliyattu Shyamalan, 2006

Uma narrativa visual a reter, pelo maravilhamento, embora com rupturas - o monstro vindo do bosque é pouco convincente e demasiado artificial, bem como o pássaro transportador da ninfa-rainha - mas que nos transporta a outros momentos da nossa existência, num percurso peregrino de passados sentires.

Paul Giamatti, uma palavra de apreço para um actor sempre supreendente, numa excelente interpretação, no papel de zelador sensível, afectuoso,   silencioso sofredor.

Composições de James Newton Howard, quatro covers de Bob Dylan interpretações de Amanda Ghost, Whisper in the noise e Silvertide.

Uma excelente banda sonora! Um filme que nos leva a questionar a nossa missão...

"When a door will open to others worlds... others wil come!"

G-S

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15.10.2006
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