Para além dos habituais espaços de leitura para adultos e crianças, audição de música, visionamento de filmes e consulta Internet, a biblioteca dispõe de uma sala que alberga parte do espólio do escritor, natural do Concelho de Vila de Rei, doado pela sua família ao Município.
Cedido pela família de José Cardoso Pires, será disponibilizado para consulta parte do espólio do autor, que inclui obras oferecidas (com dedicatória) por outras personalidades, como Alves Redol, António Lobo Antunes, Eugénio de Andrade, António Alçada Baptista, Mário de Carvalho, Mário Cláudio, Luísa Dacosta ou Jacinto Prado Coelho.
José Cardoso Pires
créditos: Autor não identificado
viva Biblioteca de Estarreja
A Biblioteca Municipal José Cardoso Pires contará, assim, com mais de 3 000 mil livros, um quadro original de Victor Palla, a máquina de escrever que acompanhou o escritor até quase ao final da sua vida e uma grande quantidade de livros a ele dedicados pela maioria dos escritores portugueses da segunda metade do século XX.
Na ocasião, será também inaugurada uma exposição de peças elaboradas por vários artistas plásticos, que responderam ao desafio de ilustrar algumas das obras do escritor falecido há dez anos.
A mostra intitula-se “José Cardoso Pires, Ilustrações da Escrita” e inclui trabalhos de Júlio Pomar e Sá Nogueira, bem como outras obras, como “O Grande Fabulário de Portugal e do Brasil” ou o primeiro número de uma edição especial de quinze exemplares de “Dinossauro Excelentíssimo”, que contém um desenho original de João Abel Manta e um fragmento manuscrito de José Cardoso Pires.
in Público
José Cardoso Pires
créditos: via RTP
Devo confessar que não é um dos meus escritores favoritos, embora tenha lido muitos dos seus livros. Reconheço o imenso valor da sua obra e a sua independência literária.
Não vou tecer explicações sobre as minhas preferências literárias. No entanto, a partir do livro De Profundis Valsa Lenta, senti-me mais próxima da sua escrita.
De Profundis - Valsa Lenta
José Cardoso Pires
Publicações Dom Quixote
https://www.bertrand.pt/
De Profundis - Valsa Lenta ocupa efectivamente um lugar à parte na obra do autor. Um dos meus preferidos da obra deste escritor.
Aí Cardoso Pires narra seu caso limite, um daqueles casos que raramente podem ser contados. O escritor sofrera um acidente vascular cerebral que lhe afectara o centro da fala e da escrita com perda total da memória. Esteve em estado de coma.
João Lobo Antunes, o médico que o assistiu, escreveu no Prefácio: "Não havia dúvida, o José Cardoso Pires sofria de uma afasia fluente grave, ou seja, não era capaz de gerar as palavras e construir as frases que transmitissem as imagens e os pensamentos que algures no seu cérebro iam irrompendo."
Desta 'morte branca' fica por explicar como foi possível regressar de um ponto que se julgava sem retorno. É portanto o auto-retrato de uma experiência-limite que me tocou profundamente.
Dez anos, também, depois da da sua morte, foi lançado Lavagante, um texto inédito.
O Lavagante, encontro desabitado foi publicado, pela primeira vez, em 1963, numa versão de três páginas, no nº 11 d'O Tempo e o Modo e intitulava-se, então, O Lavagante e Outros Exemplares. Mencionava-se na revista que se tratava de um capítulo do próximo romance.
O Delfim
José Cardoso Pires
Moraes, 1968
Surgida por ocasião da passagem dos dez anos sobre a morte do escritor - 26 de Outubro - a novela (a mais completa das três versões dactilografadas), é anterior a O Delfim (1968). Existem outras, manuscritas como O Lavagante e a Mulher do Próximo.
Conta Ana Cardoso Pires, uma das filhas, que, nas voltas do Espólio, deu com a breve narrativa aprisionada num atado. Não era mexida pelo pai há muito, seguramente desde o 25 de Abril. Papel amarelecido, esmaecido, todo por igual.
in Público
Não o li! Folheei-o numa das livrarias por onde passo em finais de tarde, em meu peregrinar literário, tal ritual 'místico' do prazer profundo que despoletam em mim os livros.
Apesar de nele encontrar fragmentos literários de grande sensibilidade, não senti a atracção suficiente para o comprar... não me perguntem por que razão!
Os livros são perfeitos instrumentos de saber e muito prazer estético. Há que sentir, mal os tocamos, que a química se desencadeia! Não aconteceu.
José Cardoso Pires
créditos: Júlio Pomar, 1949
"Aos cinquenta anos dei por mim a fumar ao espelho e a perguntar E agora, José. Fumar ao espelho, qualquer José sabe isso, é confrontarmo-nos com o nosso rosto mais quotidiano e mais pensado.
(...)
Aqui tens, José, o homem que te interroga. Que te fuma e te duvida. Que te acredita.
E com esta me despeço, adeus, até outro dia, e que a terra nos seja leve por muitos anos e bons neste lugar e nesta companhia.
Pá, apaga-me essas rugas. Riscam o espelho, não vês?"
Cardoso Pires por Cardoso Pires, Fumar ao Espelho entrevista de Artur Portela, 1ª edição, Publicações D. Quixote, 1991
G-S
Fragmentos literários
02.11.2008
Copyright © 2008-Fragmentos Culturais Blog, fragmentosculturais.blogspot.com®