domingo, 22 de março de 2009

Primavera intimista !






créditos: Dan Logen






créditos: Spring Phtotography


O perfume do sonho envolvia-a, debaixo do docel de folhas da árvore, (...)

Luisa Dacosta
, O Perfume do Sonho, na Tarde

Ed. Asa, 2004



Ontem, cheirei a Primavera!
Saí já tarde, depois de ter passado a manhã enclausurada em salas de amplos tectos, sombrios espaços frios. O sol apenas batia nas janelas altas, de onde vislumbrava pedaços de azul por entre os ramos de uma magnólia profusamente pejada de flores brancas.

Sempre que levantava o olhar para respirar o ar que chegava em jeito de lufada fantasiada pela força do espaço austero e fechado, visivelmente pintava em meu olhar o mar... ali tão perto! Liberdade! Nostalgia! Azul!


Alguns cantos alegres de pássaros eclodiam em meus ouvidos! Aí me refugiava, distanciando-me do vozear em surdina como gralhas sem asas que se amontoavam em meu redor!

Finalmente poisei o olhar no claro e aberto firmamento! Passavam poucos minutos das três da tarde.
A luminosidade a que já me desabituara, depois de um inverno tão austero e gélido, bateu-me em cheio na alma! Calor?! Sol?! Cheiro a terra e flor?!
Parei! Como que para absorver aquela fragrância mescla de perfume de japoneiras, magnólias e grandes sebes verde-claro. E olhei o firmamento, azul -celeste, raiado de curtas nuvens. Corria uma neblina translúcida! Estava bela a tarde, sedutora, apetecível ao toque sereno e frágil de dedos de pétalas inundados de poesia.

Sorvi cada pedacinho de ar morno, cálido, em passo sereno, pausado,
aspirava com profundo e doce prazer aquela tarde que pairava à minha volta, tal flor perfumada e desperta pelo odor de ondas quentes em pequenas lufadas de aragem, em festa pudica e ritmo solto. Tudo ali ao alcance do olhar e do sentir! E pensei em ti!

Fica sentado aí onde estás, Poeta, e não mexas os lábios nem os braços (...) 

Sebastião da Gama
, Poesia, Serra-Mãe, 

Ática, 1996



G-S

(texto original)


Fragmentos Culturais no "Dia Mundial da Poesia"
21.03.2009

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terça-feira, 10 de março de 2009

O Leitor : o filme, o livro





The Reader 
Stephen Daldry, 2008
http://www.imdb.com/


"The Reader is not a story about redemption or forgiveness. It is about how my generation of Germans came to terms with what the generation before us had done. If you love someone who is guilty, do you become entangled in their guilty? And Can we choose who we love?"

Bernhard Schlink

Ultimamente, tenho falado muito de cinema! É um dos meus passatempos favoritos. Talvez busque na tela, a fuga de momentos,  e afazeres que me provocam instabilidade. Uma sala de cinema é um local tranquilo, regra geral.






The Reader 
Stephen Daldry, 2008

Depois de O Estranho Caso de Benjamin Button, Milk, fui ver O Leitor

Atraía-me descobrir como fora adaptada a obra literária. Não sendo um livro espesso no formato, é um livro de temática profunda. Um livro que se lê com interesse, quase de um fôlego, e uma temática que me fascina! Os livros. A leitura. E a História recente da II Guerra Mundial, como apoio histórico.

O realizador Stephen 
Daldry - The Hours e Billy Elliot - e os actores Ralph Fiennes e Kate Winslet, foram os restantes elementos convincentes. Motivos bastantes!






Michael & Hanna
 Kate Winslet & David Kross 
The Reader
 Stephen Daldry, 2008

Reconheço que O Leitor me seduziu inteiramente! Pela interpretação, pela história, pelos livros, pela música.

Quando falo de interpretação, não destaco apenas Kate Winslet. Destaco Ralph Fiennes! Gostei da interpretação de Kate Winslet, no papel de Hanna Schmitt. Admito com sinceridade. Mas Fiennes foi fabuloso. E Kate esteve à altura.

Era difícil com Ralph Fiennes a contracenar.






Michael/ Ralph Fiennes
The Reader 
Stephen Daldry, 2008

Fiennes prendeu-me desde início até final!
Seus gestos pausados, o olhar nostálgico, as expressões divagantes, interiorizadas de um ser que se entrega ao seu próprio mundo. 

E depois, aquela profunda dedicação! A mesma que sentimos quando alguém nos 'toca'... deixou-me sensibilizada, perdida em mim !


"O Leitor é uma bela história de amor, numa história de opostos, onde a leitura e os livros servem como um progresso na relação de uma mulher madura e simples e um jovem estudante. O argumento é um constatar de como podemos ver e sermos cegos ao mesmo tempo, como páginas e páginas carregadas de letras e expressões, podem ser brancas para os olhos de muitos. Uma história simples."

Tiago Ramos




Michael & Hanna
 Kate Winslet & David Kross 
 The Reader 
Stephen Daldry, 2008
https://www.imdb.com/

Quase me deixei intimidar nos primeiros vinte minutos! O livro não entra desse modo tão intenso! É bastante mais subtil, mais suave. Respirei fundo! E aguardei! O filme tinha que ser mais, já que o livro que lhe servira de argumento é mais, muito mais do que uma relação erótica entre uma mulher madura e um adolescente.



O Leitor
Bernhard Schlink
edições ASA

belos momentos descritivos de um erotismo sensível no livro, é certo! Mas a sequência da prosa é mais pausada, mais afectuosa.


Finalmente, a história apresentou-se! Para lá da história, a narrativa principal, as outras histórias. Como lidar com a vergonha, a culpa, a liberdade, a responsabilidade, o perdão.





Michael & Hanna
 Kate Winslet & David Kross 
 The Reader
Stephen Daldry, 2008 

No filme deparamo-nos com dois momentos bem distintos! No primeiro, assistimos à história do relacionamento sexual, que ultrapassamos, embora a primeira impressão seja forte, se estivermos atentos às personagens Michael e Hanna. E aí reside o encantamento do filme! E do livro.

No segundo, o conceito de culpa, de culpa e de perdão, do Holocausto, embora este não muito bem conseguido. Mas o livro não é uma tese histórica. Já o referi. É um livro leve, de leitura suave. Sem as ortodoxas pretensões literárias. Livro que toca em acontecimentos históricos mas que fala essencialmente de gestos intimistas. Fala de pessoas, de sentimentos, de inibições, de paixões, de mágoas, de expiação.




Hanna / Kate Winslet
 The Reader
Stephen Daldry, 2008

Um filme que pretende ser reflexivo. E consegue-o, em certa medida, se pertencermos aquele tipo de espectadores que gosta de tirar conclusões. Saímos a pensar.

O Leitor mereceu críticas divididas, mas na sua maioria de pendor positivo. Cativante.






Todd McCarthy, do Variety, disse que The Reader “foi feito com sensibilidade e é dramaticamente convincente, mas passa a impressão de uma experiência essencialmente cerebral”.

Rex Reed, New York Observer, descreveu-o como “obra-prima”.

Tom O’NeilLos Angeles Times, disse ser um “candidato sério em todas as categorias principais do Oscar”. Sem dúvida.





Michael | Ralph Fiennes
 The Reader
Stephen Daldry, 2008
https://www.imdb.com/

Apesar de toda a melancolia, do dramatismo final, dos múltiplos silêncios, acaba por ser um filme de esperança. E de grande beleza poética, se destacarmos o infindável gosto pela leitura.

A leitura em voz alta e o poder encantatório nela contido. Na singeleza dos instantes, entre as palavras e os silêncios, na fragilidade da história de cada um. O que lê. O que ouve.


O drama de alguém que não sabe ler, e que prefere a condenação a confessar a vergonha de não saber ler.


A ternura do outro, do que lê, preso a esse segredo, passando horas, dias, noites, depois de anos de desencontro, a gravar os livros que outrora lera, para enviar para Hanna, na prisão, num gesto de incontido carinho.






The Reader 
Stephen Daldry, 2008
https://www.imdb.com/

The Reader é a terceira longa-metragem do britânico Stephen Daldry.

Os seus filmes anteriores,
Billy Elliot (co-produção Inglaterra/França, 2000) e The Hours (EUA/Inglaterra, 2002), já lhe deram duas 
nomeações na categoria de 'Melhor Realizador'.

Vi os dois. Li o livro As Horas de Michael Cunningham. Vi depois o filme baseado no livro. Michael Cunningham, autor que aprecio muitoDois filmes marcantes, inesquecíveis. E livros imperdíveis.

Ainda hoje, dois filmes são de referência. Intemporais. As Horas, filme é baseado no romance de Michael Cunningham. 


A fotografia do filme é um dos pontos altos, tal como a perturbadora banda sonora. E nisso Daldry e a sua equipa são extremamente competentes.

Não esquecer que foi o último filme produzido por Anthony Minghella e Sidney Pollack, dois enormes vultos do cinema, recentemente desaparecidos.





The Reader
Bernhard Schlink


"The Reader is not a story about redemption or forgiveness. It is about how my generation of Germans came to terms with what the generation before us had done. If you love someone who is guilty, do you become entangled in their guilty? And Can we choose who we love?"


Bernhard Schlink


G-S

Fragmentos Culturais

11.03.2009
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domingo, 8 de março de 2009

Neste dia...





Dave Mckean

Na água clara parada
imagem clara das flores
com a morte no pé.


Katsura Nobuko


Haiku, O Japão no Feminino, Séculos XVII a XX

Para que este dia não esqueça as mulheres que, já morreram em Portugal, neste ano de 2009, vítimas de maus tratos, no silêncio dos seus olhos, angustiadamente sós.


Para elas, com mágoa profunda, She na versão muda de Elvis Costello








G-S

Fragmentos Culturais
 


08.03.09

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