Luisa Dacosta, O Perfume do Sonho, na Tarde,
Ed. Asa, 2004
Ontem, cheirei a Primavera! Saí já tarde, depois de ter passado a manhã enclausurada em salas de amplos tectos, sombrios espaços frios. O sol apenas batia nas janelas altas, de onde vislumbrava pedaços de azul por entre os ramos de uma magnólia profusamente pejada de flores brancas.
Sempre que levantava o olhar para respirar o ar que chegava em jeito de lufada fantasiada pela força do espaço austero e fechado, visivelmente pintava em meu olhar o mar... ali tão perto! Liberdade! Nostalgia! Azul!
Alguns cantos alegres de pássaros eclodiam em meus ouvidos! Aí me refugiava, distanciando-me do vozear em surdina como gralhas sem asas que se amontoavam em meu redor!
Finalmente poisei o olhar no claro e aberto firmamento! Passavam poucos minutos das três da tarde. A luminosidade a que já me desabituara, depois de um inverno tão austero e gélido, bateu-me em cheio na alma! Calor?! Sol?! Cheiro a terra e flor?!
Parei! Como que para absorver aquela fragrância mescla de perfume de japoneiras, magnólias e grandes sebes verde-claro. E olhei o firmamento, azul -celeste, raiado de curtas nuvens. Corria uma neblina translúcida! Estava bela a tarde, sedutora, apetecível ao toque sereno e frágil de dedos de pétalas inundados de poesia.
Sorvi cada pedacinho de ar morno, cálido, em passo sereno, pausado, aspirava com profundo e doce prazer aquela tarde que pairava à minha volta, tal flor perfumada e desperta pelo odor de ondas quentes em pequenas lufadas de aragem, em festa pudica e ritmo solto. Tudo ali ao alcance do olhar e do sentir! E pensei em ti!
Fica sentado aí onde estás, Poeta, e não mexas os lábios nem os braços (...)
Sebastião da Gama, Poesia, Serra-Mãe,
Ática, 1996
G-S
(texto original)
Fragmentos Culturais no "Dia Mundial da Poesia"
21.03.2009
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